Às vezes, em dias de luz perfeita e exacta,
Em que as coisas têm toda a realidade que podem ter,
Pergunto a mim próprio devagar
Porque sequer atribuo eu
Beleza às coisas.
Uma flor acaso tem beleza?
Tem beleza acaso um fruto?
Não: têm cor e forma
E existência apenas.
A beleza é o nome de qualquer coisa que não existe
Que eu dou às coisas em troca do agrado que me dão.
Não significa nada.
Então porque digo eu das coisas: são belas?
Sim, mesmo a mim, que vivo só de viver,
Invisíveis, vêm ter comigo as mentiras dos homens
Perante as coisas,
Perante as coisas que simplesmente existem.
Que difícil ser próprio e não ver senão o visível!
(Alberto Caeiro)
1 comentário:
A luz nítida e visível, que emana da noite que atravessas, está a servir para ver a minha estrada.
Nem sempre a vejo com nitidez e a sombras enganam-me de tal modo que, por vezes, me precipito sob as pedras que ferem.
Por isso, a tua luz é clara e visível. Não vem de um candeeiro frágil, nem de uma vela, cuja chama tremeluzente ameaça apagar-se.
A tua luz é tão forte e visível que magoa ver o que tenho gasto a olhar para as pedras que me fizeram cair e que já não me fazem cair.
A tua luz é tão séria e visível que consigo ver a desarrumação daquilo que julgava bem arrumado na minha vida, ou julgava estar a arrumar bem.
Na realidade é impossível ser-se “eu próprio”, quando nem vemos o visível.
Este é o meu obrigado num “dia de luz perfeita e exacta”!
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